
A Igreja do Brasil lançou este ano, pela terceira vez, mais uma Campanha da Fraternidade sobre a educação. De forma explícita os bispos brasileiros optaram por distanciar-se de questões especificas, urgentes e concretas que afligem a educação pública brasileira. Decidiram focar, no que chamam de “fundamentos do ato de educar”.
Desse modo, cabe, então, aos profissionais da educação, a partir do chão da escola, apontar algumas questões urgentes que estão colocando em risco a existência da escola pública de gestão pública no Brasil. É o que passo a fazer abaixo, de forma didática e um tanto quanto esquemática.
Há quase três décadas, a escola pública brasileira e os seus profissionais, vem sofrendo um ataque intenso do neoliberalismo: privatização explícita e implícita, destruição da carreira docente, avaliações externas dos alunos e culpabilização dos docentes pelo fracasso escolar, estreitamento curricular; e por aí vai.
A partir do golpe de 2016 esse ataque tornou-se mais aberto e direto. A Reforma do Ensino Médio publicada por Medida Provisória no Governo Temer em 2017 é o exemplo mais claro das mutações operacionalizadas pelo neoliberalismo no campo educacional, com o protagonismo das Fundações Empresariais (Unibanco, Itaú, Instituto Airton Senna etc.) literalmente formulando as políticas educacionais para Estados e municípios. Ou seja, as políticas educacionais não são mais formuladas pelos profissionais da educação, mas pelos empresários por meio de suas Fundações caritativas.
Grosso modo é preciso que todos saibam que a escola pública vive uma crise de legitimidade e não é mais sustentada pelo discurso progressista de uma escola humanista, republicana e emancipadora, tão sonhada por Anísio Teixeira, Paulo Freire, Nísia Floresta, dentre tantos. Da extrema direita à esquerda, o discurso que sustenta as reformas educacionais em todo o país é o discurso da escola-empresa que considera a educação como um bem essencialmente privado e cujo valor é antes de tudo econômico. Nessa pegada o modelo escolar que se impõe hoje é o modelo de uma escola ajustada ao mercado com a missão de formar pessoas adaptadas (capital humano) ao jogo da concorrência e emocionalmente fortes para enfrentar as incertezas e perdas da vida.
Esse processo de mercantilização do ensino não atinge somente as escolas, mas também as Universidades, generalizando o modelo de acumulação do capital. No caso de muitas Universidades e Instituições Católicas, o humanismo serve tão somente como discurso para encobrir práticas de gestão e de ensino em muitos casos alinhadas com a exploração da força de trabalho, com a apartação social e com o lucro a qualquer custo. Por isso, de certo modo, compreende-se que os bispos brasileiros tenham evitado tocar em questões concretas da política educacional brasileira; pois, analisar a realidade concreta da educação, para além dos discursos benevolentes, poderia colocá-los diante de um espelho. Como num conto de fadas poderiam ouvir: “Decifra-me ou te devoro”.
Arnaldo Valentim Silva
Diretor de Escola
“Para falar ao vento bastam palavras; para falar ao coração são necessárias obras.”
― Padre Antônio Vieira