A pandemia e o grito dos trabalhadores excluídos

A pandemia e o grito dos trabalhadores excluídos
Fonte da Imagem: PT

Neste início de setembro de 2021, quando contabilizamos quase 600 mil mortes no Brasil e quatro milhões e meio no mundo por causa da pandemia da covid-19, e ao mesmo tempo acompanhamos na medida do possível os eventos da 34ª Romaria dos Trabalhadores e Trabalhadoras e o 27º Grito dos Excluídos, que a exemplo do ano passado serão bem reduzidos por causa dos riscos de infecção em aglomerações devido à pandemia.

Em primeiro lugar devemos sempre nos recordar de todas estas vidas que foram perdidas, lembrando que grande parte destas mortes foi por culpa do governo, onde o presidente é o responsável maior. Ao acompanhar as sessões da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia, percebemos por que houve tanta demora na aquisição de vacinas e acompanhamos estupefatos os casos de corrupção na compra de vacinas e no comércio de medicamentos ineficazes, envolvendo empresários oportunistas e autoridades governamentais, inclusive militares.

Enquanto esses empresários ganhavam dinheiro, muitas pessoas estavam morrendo da doença por várias causas. Como disse o padre Júlio Lancellotti, “não estamos no mesmo barco e sim na mesma tempestade, onde alguns a enfrentam com conforto a bordo de seus iates, a maioria nada tentando sobreviver”. Enquanto os capitalistas lucram muito durante a pandemia, a população em geral, principalmente os mais pobres que sofrem com a falta de alimentação, falta de emprego, falta de moradia digna e falta de saúde (atendimento médico, testagem, vacina para todos, etc.). Enquanto parte da população consegue fazer um isolamento social, a grande maioria da classe trabalhadora é obrigada a sair de casa para tentar ganhar o sustento, podendo assim contrair a doença, arriscando não só sua vida como também a de seus entes queridos.

Dentro da classe trabalhadora, várias categorias se destacam no risco de contrair a doença. Os trabalhadores da área da saúde, por exemplo, são os mais atingidos, pois lidam diretamente com os infectados. Não só os médicos e enfermeiros, como também outros trabalhadores de hospitais, unidades de pronto atendimento (UPAs) e outros estabelecimentos de saúde, arriscam sua vida diariamente em seu trabalho, pois já se sabe que todas as medidas de controle aplicadas atualmente, tais como vacinas, testagem, higienização, ventilação do ambiente e utilização de máscaras não são totalmente eficazes para a prevenção. Além disso, novas variantes do vírus estão surgindo devido à demora em vacinar a maioria da população.

Enquanto todos concordam que a covid-19 é uma doença adquirida no trabalho para os trabalhadores da área da saúde, o reconhecimento desta doença como sendo do trabalho para outras categorias não está acontecendo. Como se sabe, várias atividades consideradas “essenciais” nunca pararam durante a pandemia. Assim, muitos trabalhadores de supermercados, padarias, farmácias, açougues, bancos, postos de combustíveis, correio, aplicativos, frigoríficos, segurança pública, transportes coletivos e muitos outros, também adoeceram e muitos faleceram e não tiveram os direitos do reconhecimento que adquiriram esta doença no trabalho.

Sabemos também que muitos outros setores, tais como a construção civil e mineração nunca pararam também. Outras empresas tanto da indústria como do comercio, pararam durante um curto período e logo retornaram ao trabalho, alguns sem nem mudar o ambiente de trabalho para reduzir pelo menos um pouco os riscos.

Os trabalhadores, principalmente os administrativos, que conseguiram se isolar e puderam fazer o trabalho em casa, apesar de terem que assumir os custos dos meios de produção (equipamentos, acesso a internet, etc.), pelo menos conseguiram reduzir os riscos de contrair a covid-19, no entanto não se livraram de adquirir outras doenças, principalmente as psicossociais, devido ao aumento na carga de trabalho e outras formas de assédios (cobrança de metas inalcançáveis, controle do tempo, etc.).

As empresas em geral não estão abrindo as Comunicações de Acidente de Trabalho (CATs), o que é necessário para que seus direitos sejam reconhecidos, alegando que os trabalhadores poderiam adquirir a doença em qualquer lugar e não necessariamente no ambiente de trabalho. Chegam até a garantir que cumprem todos os protocolos de segurança e que agindo assim o ambiente de trabalho não tem riscos e – se – o trabalhador adquirir a doença foi fora do trabalho.

A pandemia e o grito dos trabalhadores excluídos
Fonte da Imagem: Hora do Povo

Como dissemos, não existe forma de prevenir totalmente o risco de contrair a doença no ambiente de trabalho. Além disso, a maioria da população depende de transporte público para ir ao trabalho e voltar para casa. Como se pode prevenir a aglomeração dentro de um ônibus, metrô ou trem lotado? Como higienizar os objetos compartilhados? Como saber quem é suspeito de ter a doença? Como praticar o distanciamento mínimo de dois metros? É praticamente impossível. Além disso, é importante ressaltar que as doenças ou acidentes ocorridos durante o trajeto de casa para o trabalho é considerado Acidente de Trabalho e os direitos acidentários devem ser reconhecidos. Tanto os direitos previdenciários como os trabalhistas, reforçando sempre que a “Doença do Trabalho” é equiparada ao “Acidente de trabalho” de acordo com a legislação. E que os/as que ocorrem no trajeto são equiparados aos “típicos” (que ocorrem dentro do ambiente de trabalho).

Dentre os direitos trabalhistas podemos destacar que os trabalhadores que adquiram doenças no trabalho têm estabilidade (não podem ser demitidos) de um ano e em caso de agravamento da doença poderão ser afastados para recuperação da saúde sem prejuízo de seus direitos, tais como fundo de garantia, férias, etc.

Dentre os direitos previdenciários, embora variem dependendo do caso, entendemos que o mais importante é o valor da aposentadoria do cônjuge (viúvo ou viúva) que aumenta significativamente (cerca de 40 %) caso seja uma morte reconhecida como doença do trabalho. Esta diferença de salário pode ajudar muitas pessoas que, além de perderem seus companheiros, ainda viram seu poder aquisitivo ser reduzido drasticamente.

Esta diferença salarial é importante porque estamos vivendo em plena pandemia uma situação de aumento exagerado do custo de vida, envolvendo alimentos, gás, energia, água, aluguel, etc.

Diante de todas estas injustiças, elevemos nossas intenções à Nossa Senhora Aparecida, que interceda junto a Jesus, para que todas e todos os excluídos, sejam restaurados e fortalecidos para lutarem por seus direitos, afinal como diz o salmo 33, 5 “Deus ama a justiça e o Direito”!

Gilmar Ortiz de Souza | Mestre em Saúde Trabalho e Ambiente (Fundacentro) e Engenheiro de Segurança do Trabalho (Faap)

Militante da Pastoral Operária da Diocese de Santo André (SP)