Trabalhadores da Saúde e a Pandemia de Coronavírus

O Brasil, e também Campinas, enfrenta a pior crise sanitária já vivida em sua história. Uma crise que traz consequências para todos e não só no campo da saúde: além do adoecimento e morte causados pela doença, houve um empobrecimento geral da população, particularmente daqueles que já vinham sofrendo com a piora da economia, mesmo antes da pandemia. O número de desempregados, dos que passam fome e dos que quase nada tem para sobreviver aumentou muito ao longo desse um ano de pandemia.

Trabalhadores da Saúde e a Pandemia de Coronavírus
Fonte da Imagem: Saúde Business

Uma das classes que mais tem sofrido com a crise são os trabalhadores de saúde. Ainda que tenham sido menos afetados pela crise econômica, foram os que mais sofreram de adoecimento e morte pela covid-19. Isso se explica por estarem diretamente na linha de frente, seja nos postos de saúde, seja nos pronto-socorro ou nos hospitais e em UTIs, se expondo diariamente ao risco de contaminação. Recebem uma carga de vírus muito superior à da população, mesmo daqueles que insistem se aglomerar desnecessariamente.

Os trabalhadores da saúde, entre todas as classes, foram os que mais adoeceram e morreram pela covid-19. Alguns estudos calculam que as mortes e adoecimentos entre eles pode ser, proporcionalmente, até 6 vezes maior que na população geral.

O adoecimento dos profissionais de saúde não é só o físico. Outro tipo, tão ou mais importante e preocupante, se caracterizando como epidemia dentro da pandemia, é o sofrimento mental.

Estão diuturnamente submetidos ao estresse, ao medo, ao sofrimento psíquico.

Estresse provocado pelas condições de trabalho já inadequadas antes da pandemia e que pioraram muito durante esse ano – são comuns as denúncias de falta de Equipamentos de Proteção Individual; muito dos contratos são precários sem direito a indenizações e afastamentos quando adoecem no trabalho; há a sobrecarga por falta de pessoal em número suficiente nos serviços, sejam os públicos ou os privados. Se a situação era ruim, piorou muito nesse momento da pandemia, ondefaltam leitos de UTI, já faltam medicamentos em alguns serviços e os pacientes se multiplicam nas portas dos prontos-socorros e centros de saúde. As prefeituras aumentam os leitos gerais e de uti, mas há falta pessoal treinado para conduzi-los. Isso obriga a mais sobrecarga pela necessidade de aumentar as jornadas de trabalho de cada um. As férias e licenças são suspensas, aumentando o distanciamento da família.

Há o medo de adoecer e de levar a doença para dentro de casa, contaminando pais, avós ou filhos; ocorre um sentimento de culpa quando um deles adoece, ficando sempre a pergunta: fui eu quem trouxe o vírus?

Sofrimento emocional quando assiste a morte de um paciente a quem se afeiçoar a ou quando vê uma pessoa internada morrer por falta de condições adequadas naquele serviço, como vimos acontecer várias vezes, mais agora que se perdeu o controle da pandemia.

Trabalhadores da Saúde e a Pandemia de Coronavírus
Fonte da Imagem: Nexo

A força de trabalho em saúde é composta de profissionais bem diferentes entre si. São profissionais com salários mais altos e que trabalham com mais segurança, ao lado de outros com salários muito baixos e trabalhando em condições muito mais inadequadas. Esses últimos também vivem, habitualmente, em condições mais precárias, em bairros mais pobres, tendo o estresse no trabalho amplificado poressas condições de vida. A maioria é mulher, com a situação piorada pela dupla ou tripla jornada de trabalho. Portanto, também o adoecimento e o sofrimento mental vão acometê-los de modos diferentes. Vários estudos demonstram que o pessoal de enfermagem, particularmente os auxiliares de enfermagem são os que mais tem sofrido com a pandemia, física e emocionalmente.

A proteção à saúde e à vida desses trabalhadores dependem, em última instância, dos seus empregadores, sejam os privados ou os públicos. Mas também podemos contribuir –e a nossa melhor contribuição é respeitar o trabalho deles, compreendendo as condições a que estão submetidos. E fazer a nossa parte para evitar a piora da situação: lavar as mãos com frequência, usar álcool em gel, permanecer em casa e evitar aglomerações sempre que possível. Reduzir o adoecimento e morte entretodos nós é a melhor prevenção para, também, promover a saúde dos trabalhadores.

Roberto Mardem Soares Farias

Médico Pediatra e Sanitarista da Secretaria Municipal de Saúde de Campinas – SP